O quebra-cabeça de Sara
Documentário l 10:30 l Direção: Allan Ribeiro l 2017
Em mais um dia de trabalho, Sara junta as peças de seus preconceitos.
Roteiro: Allan Ribeiro
Produção: Fausto Júnior e Allan Ribeiro
Montagem: Allan Ribeiro
Elenco: Sara Neves
Direção de Fotografia: Allan Ribeiro
Direção de Arte: Allan Ribeiro
Som: Rodrigo Maia Sacic / Allan Ribeiro
Resenha
Por: Beatriz Brandão
O acolhimento que abre a cena entre mãos, gatos e lençóis nos encaminha para a partilha de angústias e urgências de Sara. A ideia que percorre o quebra-cabeça da personagem compõe seus desabrigos, em preto e branco. Desabrigos que podem ser de qualquer pessoa, como nossos também. A composição das imagens na casa, da faxina de seu cotidiano de trabalho, nos conduz do café à ligação na janela, da louça lavada na pia ao cigarro e à fumaça, da intimidade com os gatos às passadas nos cômodos. Nos proporcionam a sensação de estar nos mesmos locais que Sara, a escutando perto de nós, uma voz que encontra nossa pele.
A cadeia narrativa de Allan Ribeiro nos leva, juntamente à Sara, a montar “pecinha por pecinha até chegar o momento”, como ela menciona durante sua fala. Consegue capturar, em 10 minutos de duração de curta, conflitos pessoais que mobilizam questões sociais. O drama de Sara com a causa LGQTQIA+ dentro de sua casa, na vivência com sua filha, a leva a pensar nessas questões para além de relações com amigos, vizinhos ou patrões. A carrega ao interior do tema, ao sentir como é afetada por ele e como problemas que ela julgava longe de si se mostravam atravessando sua vida, sua trajetória, as decisões de seus afetos.
O quebra-cabeça de Sara nos traz, através de uma única história, o imbricamento de questões como a maternidade, o racismo, o conflito de gerações, a fé e religião. Uma dramaticidade, em tela, que se mostra metonímica: nos sentimos na partilha de um processo terapêutico de Sara. Ao abrir seus preconceitos com a naturalidade de uma conversa entre comadres, o curta deixa expostas feridas, ainda abertas, de um país marcado por desigualdades e de um acolhimento fictício das diversidades.